Desenvolvimento X Preservação ambiental: Uma trégua pela vida“Somos os maiores poluidores do mundo, mas se for preciso poluiremos mais para evitar uma recessão na economia americana”. A fala do ex-presidente dos Estados Unidos, George Bush, ilustra as bases da sociedade capitalista, na qual somos motivados a consumir, ter, lucrar, ganhar cada vez mais. Tal lógica não se restringe apenas ao comportamento individual e influencia também o interesse das nações. E não somente o das mais ricas, já que os chamados países subdesenvolvidos almejam atingir o mesmo patamar econômico que os de “primeiro mundo”, só que, a exemplo de Bush, pouco refletem sobre as conseqüências negativas dos seus excessos sobre o meio ambiente.
Essa necessidade de movimentar a economia a qualquer custo faz com que se confunda desenvolvimento com crescimento. Este é feito de modo desordenado, desenfreado, “atropelando” tudo o que encontra pela frente; aquele é estudado, planejado, considera o todo e visa não apenas aumentar os lucros ou melhorar de forma imediata a qualidade de vida da população, mas reflete acerca das consequências a longo prazo. Ou seja, é feito de maneira sustentável.
Entretanto, o conceito de desenvolvimento sustentável, que prega o uso racional dos recursos naturais, para satisfazer as necessidades atuais, preocupando-se em preservá-los para as futuras gerações, é recente. Foi só nos anos 70 que a Organização das Nações Unidas (ONU) promoveu o primeiro evento de proporções mundiais para discutir o assunto. Portanto, o mundo ainda dá os primeiros passos no que diz respeito aos cuidados com a natureza e ao desejo de reparar danos e abusos que vem sendo cometidos há séculos, motivados especialmente pelo processo de industrialização, assim como por certo avanços científicos e tecnológicos. E hoje as variáveis ambientais já começam a ser incorporadas na medição do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). Só que embora ações como essa venham sendo tomadas, a batalha para conciliar desenvolvimento e preservação ambiental continua. E, para que essa convivência venha a ser pacífica, planejamento é uma das principais estratégias.
Mas quando se fala em harmonizar interesses, uma mudança de valores é fundamental. Além de promover a conscientização sobre a ajuda que certas atitudes podem dar ao meio ambiente, como o simples ato de não deixar uma torneira pingando ou de ir trabalhar a pé, deixando o carro na garagem, é necessário repensar e diminuir o consumo, adotando hábitos saudáveis, como a reciclagem e reutilização de materiais. E ainda, especialmente no caso do Brasil, deve haver maior investimento em pesquisas científicas e tecnológicas sobre formas de reaproveitamento de materiais para fabricação de todo tipo de produto, reduzindo impactos no ambiente e o uso de matérias primas, além da busca por novas fontes de energia, que não afetem a camada de ozônio e não aumentem os níveis do chamado aquecimento global, bem como métodos de tratamento de resíduos e de esgoto. Deve-se investir e intensificar estudos sobre os efeitos que todas as construções ou práticas industriais provocam no ecossistema, até porque se uma fábrica, por menos poluição que provoque, corta árvores e planta mudas no lugar, de modo a compensar o dano, esse não se restringe meramente a derrubada daquele trecho da mata natural e pode desequilibrar toda uma região. Esse é o tipo de controle que já ocorre no chamado licenciamento ambiental.
Diante disso, a postura das empresas frente às questões ambientais deve ser um diferencial, que influencie seus lucros. Assim como aquelas que desenvolvem políticas sócio-ambientais costumam ser valorizadas no mercado, pois existem até certificações, exigidas por muitos países, que garantem que determinado produto foi feito seguindo regras de proteção ao ambiente, as que agridem a natureza deveriam ser condenadas e sofrer sanções. Também podem ser executadas leis que reduzam os tributos das que são mais responsáveis nas suas atividades e multem, ou aumentem os impostos, daquelas que não procuram rever suas práticas, revertendo parte desses recursos para projetos sociais, por exemplo. O mesmo pode se dar na hora de comprar um produto: O consumidor o avaliaria não só em relação ao preço e à qualidade, mas também àquilo que está embutido na sua fabricação, como o número de árvores derrubadas, ou o volume de gás carbônico que a empresa emite, assim como o gasto de água em relação ao tempo que a natureza levará para reconstituir o ecossistema, por exemplo.
E no Brasil temos uma questão ainda mais séria: o desmatamento da floresta Amazônica, prática que já se tornou verdadeira epidemia. Para combatê-la, a fiscalização deveria ser maior, com mais pessoal e mais tecnologia, e aqueles que não seguem a legislação deveriam ser punidos, assim como os que exploram a biopirataria, “de olho” nessa riqueza natural. Afinal, trata-se de um terço da reserva de água doce do mundo e de metade do território brasileiro e que influencia fortemente o clima mundial. Contudo, deve-se buscar alternativas para que aquela área também seja aproveitada economicamente, mas de forma responsável, já que na região a exploração da terra e das árvores não beneficia somente grandes madeireiras ou fazendeiros latifundiários, mas também gera empregos para a população local. Ou seja, as questões ambientais, não só na Amazônia, como em todo lugar, tem suas nuanças socioeconômicas. E nessa região especificamente, que por muito tempo foi um tanto esquecida, deve-se olhar para aqueles que tem na floresta sua fonte de renda, de sobrevivência e estimular sua exploração ecologicamente correta, para que não aumente também a exclusão social.
E já que a situação se agrava a cada dia, o Estado poderia implantar uma política pública que, mesmo um tanto polêmica, poderia ajudar na redução do consumo, além de atenuar outros problemas sociais e de renda: o controle da natalidade. Claro que não de maneira radical, restringindo, de forma obrigatória, o número de filhos por casal, mas sim oferecendo orientação sobre métodos contraceptivos e esclarecendo sobre como a adoção dessas pode ajudar na preservação do meio ambiente, ainda que essa seja uma medida bastante controversa, inclusive nos seus resultados.
Outra questão central é a de que os grandes responsáveis pelos danos provocados ao meio ambiente são os países ricos: mais industrializados, consomem mais, produzem lixo e gastam mais energia. Isso é fato, mas não é motivo para que os países em fase de desenvolvimento acreditem que tenham uma cota em a ver no mercado da poluição e degradação do meio ambiente. Claro que países pobres e emergentes não deixarão de consumir, contudo, devem buscar novas formas de desenvolvimento, não cometendo erros semelhantes aos dos mais ricos. Até porque o planeta não aguentaria, como refletiu Gandhi, em documento publicado pela ONG World Wildlife Fund (WWF): “a Grã-Bretanha precisou de metade dos recursos do planeta para alcançar sua prosperidade; quantos planetas não seriam necessários para que um país como a Índia alcançasse o mesmo patamar?”
E para que todos tenham essa consciência a educação ambiental é uma ótima aliada. Ao promovê-la desde a infância, os hábitos são criados e arraigados ao comportamento das crianças, fazendo com que o discurso ambientalista e as práticas como reciclagem, uso responsável dos recursos naturais e redução do consumo, entre outras coisas, por exemplo, que por vezes podem soar maçantes para os adultos, sejam hábitos cotidianos, naturais para eles. Assim essas pequenas ações, que sozinhas parecem não impactar em nada, juntas são capazes de operar milagres.
E por fim, depois de tanto refletir sobre as formas de harmonizar interesses que a primeira vista parecem tão opostos quanto razão e emoção – desenvolvimento X meio ambiente – conclui-se que eles se conciliariam facilmente caso notassem que, na verdade, o que gera o conflito são, basicamente, fatores econômicos. O mundo deve despertar para o fato de que o planeta adoece cada dia mais enquanto cotas de poluição são comercializadas. Portanto, é chegada a hora de, numa atitude altruísta para alguns, sensata para outros, considerar o bem maior que está em jogo: a vida. Até porque, por mais banal que pareça a conclusão, se continuarmos nesse ritmo, em breve a possibilidade de existir vida no planeta Terra estará esgotada e ai nos daremos conta de que exigimos tanto da natureza que acabamos por destruí-la, de tal modo que ela não será capaz sequer de nos oferecer condições mínimas de sobrevivência. Como bem alertou o chefe da tribo americana Suquamish, em carta enviada ao ex-presidente Franklin Pierce, “o que fere a terra, fere também os filhos da terra. O homem não tece a teia da vida; é antes um de seus fios”. Assim, o respeito, a solidariedade e o direito à vida, não só dos seres humanos, mas de todos os organismos vivos deve prevalecer sobre o egoísmo capitalista. E esse é um argumento certeiro, que por si só deveria ser capaz de revolucionar hábitos e valores.